O jornalismo que chama a mentira pelo nome
Edição 120: mais ataques a jornalistas + hábitos de consumo de notícias + livros grátis
Olá, assinante!
Em Rio das Pedras (SP), um assessor da prefeitura hostilizou um jornalista.
Em Caxias (MA), um ex-deputado federal agrediu jornalistas e quebrou uma câmera.
No Distrito Federal, um empresário ameaçou repórteres.
Em Belo Horizonte, lançaram bombas contra uma equipe de TV que cobria um protesto de policiais.
A guerra contra os profissionais de imprensa continua no país, e em ano eleitoral a coisa costuma piorar. Do Poder Executivo federal não se pode esperar nada, mas dá pra ter esperanças com o Parlamento e o Judiciário?
VIOLÊNCIA DE GÊNERO
Na Espanha, o governo da província de La Rioja e a associação de imprensa local criaram um protocolo que orienta jornalistas a como cobrir violência de gênero e crimes sexuais.
Nos Estados Unidos, o Los Angeles Times criou um guia do que se fazer após um estupro ou violência sexual.
No Brasil, estudo da Abraji e Unesco revela que mulheres jornalistas sofrem um ataque a cada três dias, em média, no país.
Na Rússia, uma jornalista capturou a atenção do mundo com a coragem de enfrentar Vladimir Putin e a censura na TV estatal. Marina Ovsyannikova é o nome dela.
ENQUANTO ISSO…
… publicamos em nosso site um artigo de Álisson Coelho que provoca: se o jornalismo fosse mais transparente, poderíamos reduzir a violência contra jornalistas?
Rogério Christofoletti, por sua vez, parte de um episódio mal explicado na Folha de S.Paulo para rediscutir o conceito de “interesse público”. Para ir mais longe, que tal exumar este artigo científico com Guilherme Triches que analisa como o conceito aparece em 30 códigos deontológicos pelo mundo?
Tem muleta ética mais repetida por aí?
PENSATA
“Será que o meu ofício doloroso é o de adivinhar na carne a verdade que ninguém quer enxergar?”
Clarice Lispector, escritora e jornalista brasileira nascida na Ucrânia
RADAR
O que mudou na cobertura da imprensa sobre as declarações de Jair Bolsonaro entre 2020 e 2021? A adição de um verbo: mentir.
Adriana Barsotti e Leonel Aguiar analisaram dois momentos de ampla reprodução de mentiras do presidente. Em setembro de 2020, jornais qualificaram o discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU como “falso” e “sem provas”. Nenhum dos cinco veículos (O Globo, Estadão, Folha, Agência Lupa e Aos Fatos) recorreu à palavrinha mágica.
Isso não se repetiu no ano seguinte. Lupa reavaliou a necessidade de apontar mentiras na pandemia e deu aquela sacudida nos colegas. Os reflexos já aconteceram em março de 2021, durante a cobertura de um pronunciamento do presidente. “Mentira” aparece pela primeira vez nas chamadas, atrás apenas de “distorção” como a palavra mais empregada para qualificar as falas de Bolsonaro.
Barsotti e Aguiar apostam que essa mudança pode resgatar o lugar de autoridade da profissão e desconstruir narrativas da pós-verdade. “Ao nomearem a mentira, jornalistas estão interpretando e fazendo um julgamento ético que, muitas vezes, a objetividade jornalística tenta recalcar”.
Foi uma “estratégia tardia”, afirmam os autores, mas com possíveis alterações na cultura dos jornalistas. Você concorda?
HÁBITOS PANDÊMICOS
O artigo de Barsotti e Aguiar faz parte da nova edição da Líbero sobre jornalismo e conhecimento em tempos de capitalismo pandêmico. Vale a pena conferir o grande elenco que assina os demais textos.
Novo relatório do Instituto Reuters mapeou desigualdades em 100 redações de cinco países. Sabe quantos editores do Brasil não são brancos? Nenhum!
Quais hábitos no consumo de notícia foram alterados pela pandemia e devem permanecer a longo prazo? Artigo de acesso aberto na Journalism Studies.
Baixe o livro “Jornalismo e Produção de Sentido”, organizado por Maria Nazareth Bis Pirola e Rafael Paes Henriques. Capítulos sobre objetividade jornalística, rotina de telejornais, e enquadramento jornalístico sobre violência contra mulher, entre outros temas.
Tem ainda este e-book sobre competências críticas em informação, organizado por Arthur Bezerra e Marco Schneider.
Mais um: “A Linguagem da Reportagem”, de Yvana Fechine e Luisa Abreu e Lima, apresenta contribuições para o ensino do telejornalismo.
SECOS & MOLHADOS
É comum dizerem que educação midiática evita que as pessoas espalhem notícias falsas. Saiu um estudo que contraria esta ideia.
Assessor de imprensa é jornalista? A polêmica está de volta, a partir de um julgamento do Tribunal Superior do Trabalho.
Enquanto Putin não retira suas garras da Ucrânia, observamos erros e dilemas da cobertura jornalística. Nosso pesquisador Carlos Castilho aponta alguns.
Cobrir a guerra afeta a saúde mental dos jornalistas. Uma especialista dá seis dicas para os jornalistas que acompanham o conflito a distância.
Lembra do Chris Cuomo, o âncora da CNN demitido por ajudar a encobertar os assédios sexuais do irmão, governador de New York? Pois é, ele está processando a emissora e pedindo 125 milhões de dólares.
O Conselho de Informação da Catalunha apresentou estudo sobre inteligência artificial nas redações com sugestões para incluir valores éticos do jornalismo.
A Unesco vai apoiar o Conselho Albanês de Mídia para realizar pesquisas sobre a moderação do conteúdo jornalístico nas mídias sociais.
Na Austrália, a autoridade de mídia e comunicação alerta que o código de conduta digital não consegue impedir todos os danos da desinformação.
Por aqui, o PL das Fake News continua causando. Depois do Facebook, o Google criticou publicamente o projeto de lei. Ana Regina Rêgo, coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNDC), da qual fazemos parte, apontou os reais motivos das big techs. A Associação de Jornalismo Digital (AJOR) vê risco à pluralidade caso o texto seja aprovado do jeito que está.
AGENDE-SE
Lá no final do ano, de 8 a 10 de dezembro, acontece em Bordeaux, na França, o Encontro Internacional de Pesquisa em Jornalismo. São três eventos em um e a chamada de trabalhos encerra no dia primeiro de maio.
Curso novo e gratuito do Centro Knight sobre formas de monetizar e promover meios digitais sustentáveis. Começa em 11 de abril.
Bolsa Orlando Sierra da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH está com chamada aberta também até 15 de abril.
Está acompanhando o Festival 3i pelo YouTube? Todas as mesas estão disponíveis por lá.
Diretamente de nossa última edição, algumas chamadas ainda de pé: 7º Congresso de Comunicação, Jornalismo e Espaço Público (só até hoje); International Congress on Disinformation and Fact-Checking (27/03); 7º Congresso Internacional Comunicación y Pensamiento (28/03); dossiês sobre jornalismo e sociedade (Media & Jornalismo — 31/03), mitologias na atividade jornalística (Esferas — 30/04) e reportagem em quadrinhos (Sur Le Journalisme — 15/05).
Dairan Paul & Rogério Christofoletti concluíram com sucesso mais esta edição. A próxima newsletter chegará até você em 6 de abril.
Esta é uma realização do Observatório da Ética Jornalística (objETHOS), projeto do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, Brasil.