O negacionismo chegou às primeiras páginas dos jornais?
Edição 103: história apagada + "bropriating" nas redações + jornalismo longe das capitais
Olá, assinante!
No domingo, você também caçou manchetes sobre os protestos anti-governo da véspera? Entre os maiores diários, só mesmo a Folha de S.Paulo deu algo na primeira página e seus concorrentes foram muito criticados. Teve até colunista de O Globo que lembrou que o jornal deu bastante espaço para o passeio de moto de Bolsonaro e nada para as manifestações do 29M. Difícil explicar, né? Até porque não é a primeira vez que isso acontece, lembra o professor Pedro Aguiar.
Mas se ninguém mais compra jornal em papel e se a grande imprensa está desacreditada, por que tanta gente reclama? Ora, porque jornais ajudam a documentar os fatos, servem de fontes primárias para historiadores e suas primeiras páginas condensam um pouco dos humores da sociedade. São um termômetro social.
Neste caso, nenhuma grande redação pode justificar que foi pega de surpresa, já que as manifestações foram anunciadas há semanas. Ninguém pode argumentar que faltou espaço ou que uma notícia mais importante “derrubou” a pauta.
Ter ignorado o que aconteceu no sábado arranha a credibilidade dos jornais e coloca em xeque sua imparcialidade. Tudo isso custa muito.
DO INTERIOR PARA O MUNDO
Já que nem todos os jornais deram atenção aos protestos, sobrou holofotes para o trabalho da mídia independente. Nas capitais, várias manifestações contaram com boas coberturas. Mas é no interior que as iniciativas independentes podem ter ainda mais força, já que preenchem o vácuo dos desertos de notícia — aquelas regiões com poucos ou até mesmo nenhum meio de comunicação.
Nesta edição, destacamos veículos de cidades do interior pra você ficar de olho:
A Agência Amanajé, de Joinville (SC), foca em reportagens sobre cultura e direitos humanos desde o começo do ano. Cobriram no fim de semana as manifestações contra o governo Bolsonaro, assim como O Mirante, site da mesma cidade especializado em política.
Diretamente de Vitória da Conquista (BA), o Conquista Repórter estreou há apenas duas semanas, mas já tem bastante conteúdo pra você acessar — como este perfil de um andarilho hippie.
De 2020, O Pedreirense tem sede na cidade de Pedreiras (MA) e cobre diariamente a região do Médio Mearim. Eles prometem qualificar o jornalismo local com mais oferta de informação. Gostamos!
EM NOSSO SITE…
Pazuello, a “coisa de internet” e a distorção fascista da linguagem — um artigo acachapante de Sylvia Debossan Moretzsohn.
Aumento de ataques a jornalistas acende alerta sobre estratégia de segurança — o texto de estreia de Vanessa da Rocha.
No embalo dos acontecimentos do último domingo, preparamos um fiozinho no Twitter com textos que já publicamos sobre cobertura de protestos. Você vai ver que o problema não é de hoje…
ESSA TAL LIBERDADE
E por falar em liberdade de imprensa, 4 leituras inadiáveis:
139 jornalistas foram mortos em dez anos no Brasil, Colômbia, Honduras e México. Sylvia Higuera apresenta um perfil dessa carnificina regional.
Liberdade de expressão e imprensa enfrentam cenário de violações sistemáticas, dizem especialistas. Géssica Brandino mede a temperatura na Folha de S.Paulo.
As muitas faces da liberdade de expressão, segundo Luciana Gurgel.
Violência contra jornalistas recrudesce em semana de ataques e perseguições: um resumo contundente do Farol Jornalismo.
RADAR
Sua ideia já foi roubada por um colega de trabalho? Você já sentiu medo de ser demitido por ter filho? Já pediram pra você prender seu cabelo crespo porque ele chamava muita atenção?
Se você for homem, é bastante provável que as respostas sejam negativas. O contrário não pode ser dito pelas jornalistas mulheres. Mesmo sendo maioria na profissão, elas ainda são alvo constante de assédio por superiores, colegas, fontes e público.
Publicado na revista Animus, esta pesquisa revela constrangimentos enfrentados por 13 profissionais que atuam no Rio Grande do Sul.
O bropriating acontece quando homens tomam crédito por ideias que elas já expuseram anteriormente. Chefias costumam penalizar mulheres grávidas ameaçando seus empregos, segundo relatam as entrevistadas. E jornalistas negras enfrentam violências próprias, como injúrias raciais — além de representarem apenas 5% do mercado de trabalho.
A favor do agressor está o silenciamento. Nove das 13 jornalistas afirmam que não levaram os casos de assédio aos órgãos competentes. São vários os motivos: medo de perder o emprego e não conseguir outro, ser desacreditada pela justiça brasileira e reviver o trauma.
Quebrar o silêncio não depende apenas da mulher, reforçam Louise da Campo e Geder Parzianello, autores do estudo. Mas a organização em redes de apoio para proteção pessoal e jurídica pode ser o primeiro passo. Leia recomendações aqui e aqui.
ACCOUNTABILITY NELES
Jornalistas e cidadãos estão descontentes com o jornalismo na Catalunha e apostam em mecanismos de prestação de contas para qualificá-lo. Três pesquisadores formularam propostas de atuação dirigidas às redações.
Como o fotojornalismo representou o ensino remoto durante a pandemia? Há um contraste entre imagens de precariedade e a cobertura de escolas particulares, segundo esta análise.
A rotina de verificação dos profissionais que trabalham na agência de checagem do Correio Braziliense.
Pesquisa comentários no Reddit? Leia alguns cuidados éticos (como privacidade e anonimato) na hora de coletar dados.
Dilemas da profissão com jornalistas que apuram informações na dark net.
Uma investigação sobre a ética da inovação no jornalismo digital: baixe o capítulo de José Garcia Avillés do recém-lançado “News media innovation reconsidered: ethics and values in a creative reconstruction of journalism”.
Mais download de graça: baixe “Diário da quarentena — a pandemia de Covid-19 como acontecimento”, compilado de análises de pesquisadores da UFMG, UFOP e UFSC.
SECOS & MOLHADOS
Como está a liberdade de expressão dos professores de jornalismo? Uma pesquisa quer saber. Participe.
José Henrique Mariante estreou como ombudsman na Folha. Meio esquisito.
O canal Loading, único focado em games e cultura pop na TV aberta, foi extinto da noite pro dia e demitiu quase 60 funcionários. A justificativa dos donos é que o principal patrocinador desistiu do investimento…
Ele está no emprego há pouco mais de dois anos e já mentiu 3 mil vezes. Quem fez as contas foi a agência Aos Fatos e você já sabe de quem estamos falando.
Eles se expõem ao vírus todos os dias. Já passou da hora de vaciná-los. Por isso, a Fenaj lançou abaixo-assinado para a imunização imediata dos jornalistas. Afinal, o Brasil é o país onde a Covid mais mata desses profissionais.
No Observatório da Imprensa, Carlos Castilho explica por que jornalistas devem repensar a cobertura de operações policiais.
Na Dinamarca, uma repórter fez sexo quando cobria a reabertura dos clubes de swing. Se você acha que ela foi criticada, não sabe nada…
Na Argentina, um jornalista trocou as bolas e noticiou a morte do mais importante escritor da língua inglesa. Acha que ele foi criticado? Acertou!
Na Inglaterra, ainda cheiram a enxofre os bastidores da famosa entrevista que a princesa Diana deu à BBC em 1995…
Europeus reforçam as bases para seu código de conduta contra a desinformação.
Uma entrevista com o polêmico repórter investigativo Günter Wallraff, lenda viva responsável por alargar limites éticos no jornalismo alemão.
Tem meios independentes que se queixam que a grande mídia não lhe dá os devidos créditos. Às vezes, é até pior…
Newsletter nova na área: com curadoria de Luiza Caires, Polígono quer trazer os principais debates de ciência nas redes sociais. Inscreva-se!
Perdeu algum evento na última semana? Sem problemas! Você pode assistir a todas as mesas do Compolítica neste link. Tem ainda o Congresso Internacional de Jornalismo, Inovação e Igualdade, organizado pelo grupo de pesquisa homônimo da Universidade Federal do Piauí. Mais dois: o 6º Congresso Internacional de Ética da Comunicação completo e o 1º Congresso Nacional de Jornalistas Negras e Negros, todinho aqui.
AGENDE-SE
Trabalha na editoria de ciências? Olha essa: a Sociedade Brasileira de Proteção Radiológica oferece um minicurso de física nuclear básica para jornalistas. Inscreva-se!
Já estão abertas as inscrições para o Seminário de Pesquisa em Jornalismo Investigativo da Abraji. Alunos recém-graduados também podem apresentar seus trabalhos de conclusão de curso. Deadline: dia 20 deste mês.
Que tal um evento gratuito sobre podcast com jornalistas do Nexo, O Globo e Rádio Novelo? Ele é organizado pelo Núcleo de Estudos de Rádio (UFRGS) e acontece nos dias 16, 23 e 30 de junho, com vagas limitadas.
Vem aí o tradicional congresso da Intercom, em sua 44ª edição. Será no começo de outubro e você pode enviar trabalho até 12/08.
Na revista portuguesa Media & Jornalismo, um dossiê sobre populismo. Submissões até 30/09.
Jornalismo e empreendedorismo é o tema da nova chamada da Brazilian Journalism Research, com prazo até 30/11 e prevista para agosto de 2022.
Um prazo a mais para quatro chamadas: e-book Comunicação, Mídias e Liberdade de Expressão no século XXI (até 15/06), dossiê A Colonização do Jogo pelo Capitalismo Neoliberal (revista Contracampo, até 16/06), especial Gênero, Mídia e Política (revista Líbero, até 17/06) e dossiê A informação e o mal: disputas éticas, políticas e epistemológicas da Comunicação em tempos extremos da revista Mídia e Cotidiano (até 28/06).
Segundo ano de festas juninas canceladas no Nordeste. Apesar disso,
Dairan Paul
e
Rogério Christofoletti
pretendem manter a próxima edição desta newsletter para 16 de junho, logo depois de Dia de Santo Antônio. É o que dá!
Esta newsletter é um produto do Observatório da Ética Jornalística (objETHOS), projeto do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, Brasil.