O que esperar de um ano como este?
Edição 95: violência contra jornalistas + menos desertos de notícia + lógica algorítmica vs. lógica editorial
Olá, assinante!
Já faz um tempinho, é verdade, mas é importante lembrar. O ano começou com a boa notícia de que a Justiça britânica negou a extradição de Julian Assange para os Estados Unidos. A decisão foi meio esquisita e o rosto mais conhecido do WikiLeaks continua preso. Foi afastado (por ora) o perigo de um julgamento secreto que o acusaria de espionagem e traição.
Ativistas e jornalistas respiraram aliviados também. Afinal, se o Reino Unido entregasse a cabeça de Assange por publicar documentos de interesse mundial, o que impediria que repórteres investigativos não sofressem a mesma pressão e perseguição, apenas por fazer o seu trabalho?
FORÇA!
2021 dá mostras de que não vai ser fácil para os jornalistas. Por isso, é melhor se preparar. O aumento de ameaças e ataques já está fazendo com que as redações abandonem algumas das práticas mais éticas da profissão. Preocupada com isso, Kelly McBride, do Craig Newmark Center for Ethics and Leadership (Poynter Institute) fez recomendações práticas para que repórteres mantenham-se firmes na apuração sem descuidar da autopreservação.
Cuidar de si é essencial, mas em tempos de pandemia, torna-se inadiável. Assim como acumular experiências. Passado o primeiro ano da Covid-19, jornalistas já podem revisar o que aprenderam cobrindo a doença. Zelar pela saúde mental, utilizar equipamentos de proteção individual e não descuidar da segurança dos freelancers são algumas das recomendações de um longo relatório sobre os impactos da pandemia sobre o jornalismo no Sul Global e em economias emergentes. Para se ter uma ideia, o novo coronavírus já matou 756 jornalistas em 64 países, 78 só no Brasil.
Já que falamos na Covid-19, conhece nosso livro com entrevistas com especialistas da comunicação? Lançamos também um Guia de Cobertura Ética!
GRANA!
Tem oportunidade pra quem pesquisa e pra quem busca notícia!
O InternetLab vai apoiar pesquisadores individuais ou investigações coletivas inovadoras que ajudem a identificar distorções e manipulações do debate público na internet. Os benefícios podem ir de R$ 5 mil a R$ 30 mil. O prazo está logo ali na esquina, dia 15 de fevereiro. Então, não perca tempo!
Já The Intercept Brasil e Data Privacy Brasil vão apoiar quatro jornalistas para fazerem reportagens sobre tecnoautoritarismo. As microbolsas são de R$ 4,5 mil cada, e as propostas devem ser enviadas até 1º de março.
MENOS DESERTOS
Saiu no começo do mês a quarta edição do Atlas da Notícia, iniciativa que mapeia veículos de jornalismo no Brasil.
Entre os principais resultados do estudo, estão a queda no número de desertos de notícias e o crescimento de veículos digitais. Atrás apenas das rádios, a categoria engloba sites e blogs individuais.
Apesar da redução animadora nos municípios sem cobertura local, os desertos de notícia, quando somados aos quase desertos, ainda representam 29,6% da população brasileira. Outro dado relevante no relatório é o fechamento de 61 veículos jornalísticos em 2020.
Análises para cada região do país podem ser lidas aqui.
RADAR
No submundo acadêmico do jornalismo, a entressafra de fim de 2020-começo de 2021 rendeu bastante! Prova disso são os três (!) blocos de Radar que você acompanha a seguir.
Pra começar, este estudo aponta uma tendência no jornalismo estadunidense: tweets são tratados cada vez mais como conteúdo e menos como fonte, sendo reproduzidos sem maiores questionamentos.
A conclusão veio após uma análise de 365 notícias publicadas no intervalo de um ano em 102 veículos (de jornais a canais televisivos). Os resultados confirmam que jornalistas utilizam tweets como um material que fala por si só. Em poucos casos, o uso das informações serve para contextualizar, corroborar ou contradizer fontes externas ao Twitter. Ou seja, se tá na internet, é verdade. Pe-ri-go!
Entre os impactos que isso pode causar, Logan Molyneux e Shannon McGregor destacam a capacidade das redes sociais de se sobreporem aos valores jornalísticos. “Jornalistas assumem o papel de descoberta e amplificação, ao invés da verificação independente”, sintetizam.
Nesse troca-troca de lógica editorial por lógica algorítmica, você já sabe quem sai ganhando: as plataformas.
MAIS TWITTER
Falando em fontes e redes sociais, o artigo de Marília Gehrke e Marcia Benetti na última Brazilian Journalism Research é um bom complemento à discussão de Molyneux e McGregor. Elas lembram que o contexto de desinformação e desintermediação das informações exige cuidados redobrados. “Depender apenas de uma plataforma que pouco revela seus algoritmos parece arriscado, visto que a automatização condiciona até mesmo o tipo de mensagem produzida e circulada nesse espaço.”
Na mesma edição, outro destaque é a pesquisa de Amanda Jurno e Carlos d’Andréa sobre plataformização do jornalismo. Cursos e treinamentos oferecidos pelo Facebook Journalism Project em parceria com institutos como First Draft, Poynter e International Center for Journalists são também um esforço para moldar valores e práticas do que é um jornalismo “legítimo” e “aceitável”. Segundo os parâmetros da plataforma, é claro. Aliás, a gente já bateu nessa tecla em dois textos publicados no objETHOS: vá aqui e aqui, caso tenha interesse.
PERFIL DOS ASSESSORES
Jornalistas catarinenses migram para a assessoria de imprensa em busca de estabilidade e segurança econômica. São profissionais jovens, com formação em jornalismo e pós-graduação, segundo este perfil.
Gil Baptista Ferreira questiona se a crença na desinformação está associada ao consumo de determinadas fontes. Os resultados de uma survey sugerem que pessoas com atitudes populistas tendem a se afastar da mídia mainstream.
Dois artigos sobre ensino laboratorial de jornalismo durante a pandemia na última edição do periódico Estudos de Jornalismo.
O papel de uma rádio universitária na promoção do interesse público. Análise de Helton Ribeiro e Carlos Monteiro a partir da programação da Unesp FM.
Na Chasqui, um dossiê sobre desafios da cobertura ambiental em meio à crise.
E-BOOK DE GRAÇA? TEMOS!
Pesquisa em comunicação: jornalismo, raça e gênero. Organização de Francielle Mendes, Francisco Queirós e Wagner Silva.
Impactos político-comunicacionais nas eleições brasileiras de 2018. Organização de Emerson Cervi e Maria Helena Weber.
Narrativas midiáticas: crítica das representações e mediações. Organização de Rosana Soares e Mayra Gomes.
Vulnerabilidades, narrativas e identidades. Organização de Cynthia Miranda, Maíra Evangelista de Sousa, Carlos Alberto de Carvalho e Leandro Lage.
SECOS & MOLHADOS
Empregos formais para jornalistas diminuíram 17,42% na última década. Mulheres jornalistas têm mais presença nas redações e menor salário; pretos e pardos ocupam apenas 13% dos postos de trabalho; e jornais e revistas são os setores que sofreram maior redução. Os dados são do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socieconômicos (Dieese), em estudo feito para o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo.
Baixe um protocolo de apoio para redações e jornalistas vítimas de assédio virtual. O material tem quatro partes: denúncias, avaliação de riscos, mecanismos de apoio e reavaliação.
O pesquisador Pedro Aguiar reuniu uma lista no Twitter com mais de 160 contas jornalísticas sobre a África. Siga!
Afinal, o que é jornalismo profissional? Taís Seibt, jornalista e professora na área, arrisca responder.
Tem gente nova na crítica de mídia! A Federal Rural do Rio acaba de criar o Observatório de Mídia UFRRJ, coordenado pela professora Ivana Barreto. Bem-vindos e longa vida ao projeto!
A Coalizão Direitos da Rede, da qual o objETHOS faz parte, criticou a retrospectiva festiva que o Ministério das Comunicações fez de seu trabalho em 2020. A pasta de Fábio Faria precisa trabalhar muito ainda pra termos o que comemorar na área…
Cansou do jornalismo pessimista e derrotista? Esta iniciativa espanhola promete um jornalismo construtivo, que oferece esperança e alento.
EUA: o mítico editor Martin Baron vai se aposentar no final do mês, e com 45 anos de jornalismo, deixa algumas reflexões éticas sobre esta nobre profissão.
Vizinhos do Foro de Periodismo Argentino (Fopea) acabam de atualizar seu código de ética.
África do Sul: relatório de uma comissão de inquérito aponta desafios éticos enfrentados pelo jornalismo local.
Conhece a agência Diadorim? O protagonista de Grande Sertão: Veredas dá nome à mais nova iniciativa brasileira de jornalismo independente, com foco na cobertura de direitos da população LGBTI+.
No objETHOS, nossa pesquisadora Lívia Vieira explica porque desigualdade e questões éticas são os grandes desafios da Inteligência Artificial no jornalismo.
AGENDE-SE
Hoje, às 19h, tem lançamento do livro “Conferência Nacional de Comunicação, 10 anos depois: os desafios das Políticas de Comunicação no Brasil”, publicado pela Ulepicc. Após o evento, será possível baixar o e-book no site do Intervozes.
Que tal um curso sobre jornalismo como arte? É gratuito, em 25 de fevereiro, e será ministrado pela jornalista e pesquisadora Fabiana Moraes. Inscreva-se.
Abraji oferece treinamento sobre grafos, dados abertos e transparência como aliados da investigação jornalística.
Até o final do mês - 28 de fevereiro -, a Radiofonias recebe textos sobre rádios universitárias em tempos de ataques à ciência. O segundo dossiê do periódico em 2021 é sobre os 30 anos de estudos radiofônicos. Para este, o prazo vai até 27 de junho. Chamadas de trabalho aqui.
Um dossiê sobre infodemia na Liinc. São aceitos artigos sobre desinformação, credibilidade, algoritmos racistas, negacionismo científico... Até 31 de março.
Direito à comunicação, monopólios e grandes plataformas digitais são temas pertinentes ao novo dossiê da revista Eptic sobre Geopolítica das Comunicações. Prazo: 30 de abril.
O centenário de Paulo Freire será comemorado em especial da Comunicação & Educação. Sai no final do ano, com chamadas abertas até 31 de maio.
Até 15 de fevereiro é possível submeter trabalho ao 27º Congreso Internacional da Sociedad Española de Periodistas. Neste ano ocorre no final de maio, online. Tema: os desafios e expectativas do jornalismo frente às transformações digitais.
Abertas as inscrições para a 9ª edição do congresso Compolítica. Democracia e opinião pública em tempos de fake news é o tema. Prazo: até 22 de fevereiro.
Já o 6º Congreso Internacional de Ética de la Comunicación recebe resumos até 28 de fevereiro. O evento online é organizado pela Universidad Complutense de Madrid.
Pauta Geral vai publicar dossiê sobre jornalismo e histórias em quadrinhos. Editores recebem textos até 10 de abril.
Prepare-se ainda para a 15ª Conferência Brasileira de Mídia Cidadã, que acontece remotamente entre 22 e 24 de junho. Trabalhos completos devem ser enviados até 23 de maio. Confira o site do evento.
Pra fechar: que tal uma conferência sobre o famigerado futuro do jornalismo? Quem oferece é a Cardiff University, do País de Gales. Resumos podem ser enviados até 18 de fevereiro. Corra!
Certos de que não vão desfilar neste Carnaval,
Dairan Paul & Rogério Christofoletti
capricharam nesta newsletter. Se gostou, jogue confete. Se não, espere a próxima edição no dia 24...
Este é um produto do Observatório da Ética Jornalística (objETHOS), projeto do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, Brasil.